terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Tédio

Você que está lendo meus relatos deve estar sentindo o mesmo que eu. Não sei qual outra razão levaria uma pessoa a ler o que uma adolescente comum escreve em seus momentos ruins... Enfim, já que está aqui vou te contar tudo.

Tédio.
Então este estado permaneceria ainda por muito tempo... O torpor que jamais parecia abandonar minha mente. O constante estado em que meus pensamentos estavam era a inércia. Seguiam uma linha e não evoluíam ou regrediam. Aquilo era entediante demais para que minha sanidade se mantivesse.
Nunca havia imaginado que não conseguiria encontrar alguma maneira de distrair-me. Meus problemas devoravam-me por dentro. Logo eu estaria louca. Era uma realidade. Eu precisava encontrar algo para pensar antes do fim.
Música não adiantava mais. Era irrelevante. Qualquer estilo parecia sempre o mesmo. Eu não conseguia mais diferenciar o baixo, a bateria e a guitarra das canções barulhentas que sempre usei como fuga. Tudo me levava a pensar no maravilhoso som do piano. Eu não aguentava mais ouvir o som daquele lindo piano tocando minhas músicas prediletas. As mãos firmes que a tocavam. Não havia sequer uma partitura para a qual Gab pudesse estar olhando. Ele mirava o nada. Seus olhos fechados.
Encantada apenas observei. O piano negro fazia um contraste forte com a sala branca e marfim. Era maravilhoso. O mundo era maravilhoso, até que Gabriel foi embora para sempre e me deixou aqui. Entediada.

Como eu pude acreditar que seria para sempre tanta perfeição?
O som do piano não saía de minha mente. Clair de Lune, Bella's Lullaby e Aizome. As mais lindas melodias. As mais lindas recordações. As mais lindas tristezas. Os mais lindos amores. Os amores mais impossíveis. Como o meu.

“Nunca a abandonarei, Zöe. Confie em mim. Vou viver em função de você. Apenas para te fazer feliz. Vou tocar este piano sempre que você estiver triste. Seremos felizes a vida inteira. Você nunca vai chorar por minha causa. Nunca te farei chorar. Prometo.”

A linda promessa de Gab passou por minha mente como um sussurro. Uma memória distante, quase esquecida, mas que se recusa a parar de me torturar.
Como fui tola. Como fui estúpida em acreditar que nunca choraria por ele. Demorei até perceber que Gab jamais voltaria e que eu estava esperando como a louca da canção do Maná. Aquela que esperou durante anos por seu verdadeiro amor no porto de San Blás e envelheceu lá. Esperando-o, sem que jamais visse sequer sua embarcação novamente.
Ri um pouco com a comparação. Gab não era um marinheiro, e sim um intercambista. Mas Gab estava de passagem também. E havia prometido ficar para sempre. A viagem era temporária. Até o telefonema em que ele disse estar voltando à Itália, mas que voltaria em breve para o Brasil.
Dois anos.
Dois anos foi o tempo em que o esperei antes de mandar a primeira e última carta. A carta que dizia os meus sentimentos e que demonstrava o quanto eu tinha sido infeliz nos últimos tempos. Vou mostrar a você a carta. Eu estava ouvindo a linda Clair de Lune, do Debussy quando escrevi tudo o que estava em meu coração.
Desculpe se estiver melancólica, mas você sabe como é, né? O sentimento é horrível, então as cartas também tem de ser.

Gabriel,

dois anos se passaram e sua promessa ainda não foi cumprida. Você não voltou e nem ao menos me ligou para saber se eu ainda estava sequer viva. Saiba que a sua primeira promessa foi quebrada na hora em que você decidiu retornar à Itália. Lágrimas escorreram por meu rosto e o único motivo era você.
Não sei se você ainda lembra de quem sou eu, mas ainda assim tenho esperanças de que eu tenha marcado pelo menos um pouco a sua estadia no Brasil. Foi um longo ano.
Ainda escuto as melodias que você tocava para mim no piano que tenho aqui. Nem sequer encosto no piano desde que você partiu, com medo de que eu afaste sua presença daquele lugar.
Gab, eu te esperei por tanto tempo... Chorei tanto por você.. Implorei a meus pais para que eu fosse à Itália apenas para te ver, mas eles não estão em condições de viajar e não me deixaram ir sozinha.
Realmente estou arrependida por tudo o que eu deixei de fazer nos últimos dois anos. As festas que não fui. Os garotos que neguei. As amigas que abandonei. As horas que passei apenas lembrando e ouvindo as melodias que você tocava pra mim.
Desculpe, Gab. Eu não posso mais.
Não vou mais te esperar.
Não vou ser como a louca da canção do Maná. Não vou ser como ela e esperar você até que meus cabelos fiquem brancos e eu perca a sanidade. Preciso me divertir. O tédio da sua ausência está me matando!

Adeus, Gab.
Para sempre.

Zöe


Entenda, não foi nem metade do quis dizer desde o início. Gab me machucou de verdade. Nem mesmo tive vida depois que ele foi embora.
Ele ligou assim que recebeu a carta. Disse que sentia muito e que não voltaria porque os pais dele não deixavam. Não acreditei.
Agora já não importa mais. Tomei minha decisão. Vou viver como eu sei viver. Sem ele. Tomada por um estado de espírito chato e por uma constante.
Tédio.
Então este estado permaneceria ainda por muito tempo... O torpor que jamais parecia abandonar minha mente. O constante estado em que meus pensamentos estavam era a inércia. Seguiam uma linha e não evoluíam ou regrediam. Aquilo era entediante demais para que minha sanidade se mantivesse.

Um comentário:

Pedro Guimarães disse...

mt bom, melhor do que as minhas concerteza (: